segunda-feira, 26 de abril de 2010

O salão da mata

Estendido no clarão
Um tapete riscado
De obeliscos de mármore
Uns trechos de chão, uns buracos,
Uns riscos de som e de luz
Uns caroços, manchas verdes.
O maior e mais realista carpete
Encrostado na terra
Forrando cambaleante a serra
Num ar insípido insólito
E tetos retos
Como se um quadriculado de cubos
De enorme maciez.

Cotidiano

(Escrito de 14 a 23 de Abril de 2010)

I

Roda de vidro
Roda presa
Entre as alas do saguão
No feitio de seus pontos
Vai-se a cria do vento,
Tempo,
Num relapso tontear.

II

Cubo branco,
O que será de agora?
Diga o que fazer
Entre as tuas paredes;
Conta o que picharam no teu chão
Com letra de mão
Em garrancho encaixado
Para caber no teu vão.

III

Tranço entre negros cipós
Um vasto quadriculado
De contos enumerados
Em rasgos azuis.
Voo de galho em galho
Sete a sete
Um a um
Mergulhando em seus troncos
De caixas profundas
Dentro de um plano branco.

IV

Chumaço de almaço pintado
Uns vários retratos falados
E páginas contadas
(As páginas sempre contadas);
Assim se esvazia o espaço
Entre hojes e amanhãs -
Num pequeno caderno
De fotografias terçãs.

V

Um som rotineiro
É o de rasgar papel
A cada trintena.
E quem sequer notou
Que, entre planos brancos,
Números pretos e traços azuis,
Vive de rasgar trintenas?

Conformação

(Escrito em 18 de Abril de 2010)

De um em tantos se fizeram dias vazios
De uns tantos vazios os dias
De uns dias os fios
Lampejantes,
Cortados em degredo.
Eventuais como poças
Encarando o asfalto
Pintando-lhe o céu
Rasgando nos passos
De um escarcéu.
Poça de fios
Cabos relapsos como cabelos
Espalhados na parede
Feito fotografias que desejam ser reais;
Pinturas querendo saltar.
Mas como um mundo preto e branco de fios
Pode saltar para cá,
Onde é cinza?
Resta pintar fios grisalhos
E torcer por cabelos negros.

Casarte

(Escrito em 12 de Abril de 2010)

Esta rua esfarelada
De granizo espesso
E desnorteadas bolas azuis
Enrugadas em plástico
Borracha fina, sadomasô,
Das casas noturnas de vinte andares
Lembra um estúdio branco
De amplas janelas
Chão de madeira
Telas chamuscadas em ateliês
E respingos de tinta.
Parece que os gordos sacos celestes
Explodiram no quarto
Pintaram em banana e xorume
Uns rasgos no quadro.
As linhas da calçada
Tracejadas falhadas
Entre grãos e vãos
Parecem-me o empório
De um famoso artista
Gay, decadente,
Que pinta minha casa
De azul sadomasô
E branco espaçoso
Num cinza confortável.